A revolução silenciosa do cinema negro brasileiro

Em um país onde o audiovisual ainda é profundamente marcado por exclusões históricas, o cinema negro brasileiro surge não só como resistência, mas como um gesto poderoso de afirmação. Mais do que ocupar espaço, diretores, roteiristas e atores negros estão propondo novas formas de existir, narrar e transformar. E isso vai muito além da visibilidade nas telas.

Durante o mês de junho, o Cine Humberto Mauro, em Belo Horizonte, celebra um dos maiores nomes da nossa cultura com a mostra Intérprete do Brasil, dedicada ao legado de Grande Otelo. Para muita gente, ele é só aquele rosto familiar dos clássicos da Atlântida, mas sua importância vai muito além dos papéis cômicos e estereotipados que o cinema lhe impôs. Otelo é símbolo de luta, talento e sobretudo de “descaptura” — um termo que representa romper com o lugar subalternizado em que tantos artistas negros foram confinados.

Mas a pergunta que paira no ar hoje é: quem está contando nossas histórias e quem está lucrando com elas? O mercado, em sua lógica voraz, muitas vezes transforma a presença negra em tendência, em produto — sem devolver o protagonismo ou o poder de decisão para quem faz parte dessas narrativas.

A pesquisadora Tatiana Carvalho Costa, em artigo publicado pela Folha de S.Paulo, chama a atenção para o papel central do cinema negro na disputa pela ideia de humanidade. Segundo ela, esse cinema não se resume a um gênero ou estética, mas a um projeto coletivo que busca romper com um sistema que insiste em marginalizar ou capturar corpos e histórias negras.

Esse movimento tem nome: QuilomboCinema. A proposta é simples e poderosa — aquilombar-se. Ou seja, construir em rede, com escuta, cuidado e partilha. Nos últimos dez anos, uma nova geração de cineastas negros tem feito exatamente isso, ocupando curadorias, festivais, editais e outros espaços de decisão. São profissionais que não querem apenas “participar do jogo”, mas mudar as regras dele.

Fazer cinema negro no Brasil, portanto, é um ato político e também afetivo. É lutar por dignidade, espaço e memória. É dizer que nossas histórias importam — e que elas podem ser contadas por nós, com as nossas vozes, sem precisar pedir licença. Porque, como bem afirma Tatiana, “cinema negro é cinema brasileiro, porque revela o que o Brasil insiste em apagar”.

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